Rodrigo Araújo
As novas coberturas para os planos
de saúde deveriam ser disponibilizadas para o consumidor em janeiro
de 2020, mas a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS),
responsável por atualizar esse rol de procedimentos, atrasará em 01
ano a definição e efetivação dos novos tratamentos que passarão a
ser cobertos.
Esse atraso tem consequências
importantes. De um lado, irá propiciar uma grande economia de
recursos pelas operadoras de saúde e, de outro, causará imenso
prejuízo para o consumidor e também para o Poder Judiciário, que
terá que prover o Direito dos usuários de planos de saúde, com
forte impacto na Judicialização.
A atualização do rol da ANS
A ANS é responsável por atualizar,
a cada ciclo de dois anos, a lista de procedimentos que devem ser
cobertos pelos planos de saúde, conforme determina o art. 3º da
Resolução Normativa (RN) n. 439/2018, da própria ANS e essa
periodicidade tem sido respeitada pela agência reguladora que,
desde o ano de 2012, efetivou a inclusão das novas coberturas
regularmente no mês de janeiro dos anos pares.
Mas, dessa vez, a atual gestão da
ANS não cumprirá o prazo, frustrando a expectativa legítima do
consumidor.
De acordo com o cronograma da ANS
para este ciclo de atualização, a publicação da Resolução Normativa
com a indicação das novas coberturas está prevista para novembro de
2020, o que não significa dizer que estarão disponíveis nessa data,
já que é previsto um prazo para a nova Resolução entrar em vigor a
partir da data de sua publicação.
Não há garantias de inclusão
Como se não bastasse o adiamento da
inclusão das novas coberturas, a frustração do consumidor pode ser
ainda maior, pois não há garantia e nem mesmo indicativos de quais
procedimentos serão ou não incluídos, independentemente da
comprovação de eficácia e imprescindibilidade do tratamento.
Existem procedimentos praticados
regularmente pela medicina brasileira há muitos anos, alguns há
mais de uma década e que, muito embora tenham plena e absoluta
comprovação de eficácia e até mesmo de falta de alternativa
terapêutica, não são aprovados pela ANS.
Exemplo disso é o implante
transcateter de prótese valvar, que é um procedimento realizado no
Brasil desde o ano de 2008 e que, desde 2012 tem parecer do
Conselho Federal de Medicina 1 que afirma: “A técnica de implante
por cateter de prótese valvar aórtica é um procedimento seguro e
eficaz para corrigir a obstrução valvar em pacientes idosos com
estenose aórtica acentuada ou comorbidades, e com contraindicação
cirúrgica.”
Ainda assim, a ANS não aprovou a
inclusão desse tratamento nos ciclos anteriores de atualização do
rol, restando aos pacientes a alternativa de pagar o tratamento com
recursos próprios ou a de se valer de ações judiciais.
Como pensa o Poder Judiciário
O Poder Judiciário tem entendimento
amplamente majoritário no sentido de que é abusiva a negativa de
cobertura de um tratamento apenas em razão de ele não constar do
rol da ANS ou não atender as diretrizes de utilização previstas
nesse rol.
Alguns Tribunais, inclusive, já
sumularam esse entendimento, como é o caso do Tribunal de Justiça
de São Paulo, que assim se pronuncia 2: “Havendo expressa indicação
médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento
sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar
previsto no rol de procedimentos da ANS”
Impacto na Judicialização
Entre as ações ajuizadas para
requerer a cobertura de algum tipo de tratamento médico contra as
empresas de planos de saúde, a causa de maior volume é, com folga,
aquela que se baseia na negativa de cobertura em razão de o
procedimento não constar no rol da ANS.
E cada atualização desse rol
reflete diretamente na diminuição desse tipo de ação, já que muitos
pacientes não precisarão mais recorrer à Justiça.
Mas não será assim dessa vez. O
Poder Judiciário não só não contará com o alívio que seria
proporcionado pela atualização do rol como também sofrerá com o
aumento causado por novos tratamentos e medicamentos que poderão
surgir nesse período e que não serão incorporados ao novo rol.
Por ora, ainda não há como avaliar
números exatos do impacto na Judicialização da Saúde porque não se
sabe quais serão os procedimentos que serão aprovados pela ANS.
Somente quando a lista for divulgada é que será possível fazer um
levantamento da quantidade de ações ajuizadas a partir de
janeiro/2020 e que poderiam ter sido evitadas se a ANS tivesse
cumprido seu prazo.
O que fazer em caso de o tratamento
ser negado
Uma via administrativa de solução
de conflitos é fazer a reclamação perante a ANS, mas a agência
reguladora, diferentemente do Poder Judiciário, entende que é
legítima a exclusão de cobertura se o tratamento não estiver
elencado no rol de procedimentos, de forma que, se esta for a
justificativa da operadora no processo de notificação de
intermediação preliminar (NIP), a ANS dará a reclamação como
“resolvida” sem, no entanto, solucionar o problema do
consumidor.
Portanto, de posse da negativa de
cobertura do tratamento sob a justificativa de não estar incluído
no rol, o consumidor, independentemente de fazer ou não a
reclamação para a ANS, poderá ajuizar a ação judicial e requerer em
sede de tutela de urgência (liminar), a disponibilização imediata
do tratamento se demonstrar que é um situação de urgência.